segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Mini Aula 6: Tolerância - (Breve Curso de Ética baseado no livro de Shafer-Landau, O que afinal aconteceu com o certo e o errado?)


Cap. 7 – Tolerância

A maioria dos estudantes do ensino superior pensam que a posição padrão na filosofia moral de hoje é o ceticismo ético, mas não pensa assim por causa de um argumento sólido, mas em grande parte porque é estranho pensar que juízos morais poderiam ser objetivos. 

Mas entre os argumentos endossados, está é o argumento a partir da tolerância. 

Uma primeira versão porém parte do próprio ceticismo (1): Se o ceticismo é verdadeiro então devemos ser tolerantes com todas as visões morais; ora, o ceticismo é verdadeiro; logo, devemos ser tolerantes com todas as visões morais.

Porém, (i) este argumento assume como verdadeiro algo que precisaria ser demonstrado, que o o ceticismo ético é verdadeiro. Assim, ele não é um argumento em prol do ceticismo, mas a partir dele, e não mostra por exemplo, que o ceticismo é o único candidato compatível com a tolerância. (Imagine substituir ceticismo por objetivismo, o argumento também funciona, ao menos se entre os juízos que não dependem da nossa opinião ou do consenso social, estiver um que diga que devemos ser tolerantes).

(2) Uma outra versão, mais forte, do argumento é: quem adota a tolerância deve ser eticamente cético; nós devemos adotar a tolerância; logo, devemos ser céticos. Uma variação: Se o objetivismo fosse verdadeiro, algumas visões seriam inferiores a outras e estaria ok tratá-las assim; isso contraria a tolerância; logo, o objetivismo não adota nem defende a tolerância. 

Tudo isso porém é um equívoco, pois não se pode concluir, da ideia de que algumas visões são moralmente ruins ou inferiores, que está tudo bem em tratá-las como inferiores (isso é um non sequitur!). Por que? Porque confundem-se aqui duas perguntas diferentes. A primeira, uma visão moral de alguém ou de uma sociedade é correta (ou justa, ou adequada, ou boa)? A segunda, se ela não o é for, o que devemos fazer a respeito? (Defender que a mutilação de meninas é errada não implica endossar o envio dos marines americanos para que invadam os países em que isso está ocorrendo!)

O objetivismo ético está comprometido apenas com a tese de que o certo e o errado não dependem exclusivamente de nossos gostos individuais ou de nossas tradições sociais e arranjos sociais.
Mas com isso, os objetivistas podem embasar muito fortemente a tolerância, por exemplo, como um valor objetivo independente.

Mas há mais coisa: o ceticismo ético é incompatível com a tolerância, se bem compreendido: p. 32 # 1: Se o ceticismo está certo, então nenhuma recomendação moral é verdadeira (nihilismo), ou independente dos gostos individuais (subjetivismo) ou coletivos (relativismo); logo, a recomendação de tolerar ou é uma ficção (N), ou é uma das opiniões contingentes nossas ou de nossas sociedades. Mas isso não será uma boa notícia para quem realmente valoriza a tolerância, por exemplo, luta por ela em lugares onde ela não existe.
Se toda recomendação é falsa (teoria do erro), aquela que diz para tolerar também é falsa, e está ao par com a recomendação de ser intolerante; se o certo e o errado estão nos olhos de quem vê, quem vê a intolerância como certa não estará fazendo nada de errado, ao contrário, estará inclusive fazendo seu dever; e se adotamos o relativismo social, a tolerância só será valiosa nas sociedades que a tornaram um valor fundamental, mas não naquelas que reprimem, perseguem, queimam livros de opositores (e opositores). Numa sociedade intolerante, você deve ser intolerante para cumprir seu dever, caso o relativismo seja verdadeiro.

Os céticos em geral consideram a tolerância algo bom, mas só o objetivismo dá embasamento seguro a tal valor. Por que? Porque a tolerância não dependerá apenas do gosto individual ou do consenso social, e caso o indivíduo ou sociedade sejam intolerantes, pior para eles, pois estarão errados moralmente. É melhor abandonar a ideia de que o certo e o errado dependem, como palavra final, do indivíduo ou da sociedade, concluir Shafer-Landau.

"Se você acredita que todos são detentores do direito ao respeito, a certa parcela de liberdade pessoal, e a um conjunto básico de direitos humanos, então seria melhor você abandonar a ideia de que os indivíduos ou sociedades detêm a palavra final na ética. O objetivismo pode confiantemente sustentar essas proteções morais centrais. O ceticismo não pode". (p. 33)

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