terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Natal: sobre por que ser (e por que não ser) cristão hoje. (I)

A vida cristã se estrutura em torno das seguintes ideias-força: Deus é amor; amar a Deus é amar ao próximo; amar ao próximo é fazer-lhe o bem, em especial, repartir do que temos com quem está em necessidade. Simples, e difícil de ser praticado. 


Eu mesmo penso que entendo mas não posso dizer exatamente que pratico: praticar o cristianismo (o amor cristão, o agape) hoje, é ser altruísta. Só. Não precisamos de mais nada: de metafísica, de espiritualidade, de moral, de política. 


Há outras formas de vida e outras religiões que são altruístas, o próprio altruísmo como ideal de viver para além de si mesmo e dos interesses mais imediatos e egocêntricos (ou egoístas) parece atrativo por si mesmo, e está bem que seja assim. 


Mas é possível, ainda, saber dessa possibilidade de vida, ou praticá-la, por causa de uma religião, dentre elas, a de Jesus Cristo. E é possível tomar a vida cristã como uma forma de confirmação e motivação para este tipo de vida: o exemplo de Jesus Cristo, a tradição viva dos seus seguidores até hoje, e, sim, em certo sentido, a metafísica cristã, a espiritualidade cristã, e a moral cristã como acessórios motivadores (elas não são essenciais e não podem tomar o lugar do essencial, mas podem ser acessórios). 


Por exemplo, a metafísica cristã do sentido da existência ou da existência de Deus, seja como um ser pessoal, seja como o grande mistério da própria existência de tudo; a espiritualidade cristã da meditação individual ou coletiva; a moral cristã de mandamentos proibitivos de atos que prejudicam terceiros (também chamados de "deontologia"). 


Excluo de propósito a política, mas, quando ligada à ética, a política do bem comum também é um ponto de confirmação ou de motivação da vida altruísta. 


Essas quatro práticas podem confirmar ou corroborar o ideal cristão essencial do agape, e podem motivar-nos psicologicamente. Com isso em mente, penso que posso agora responder á pergunta "por que ser cristão hoje". 


A resposta tem duas faces (de uma mesma moeda): primeiro, porquê, desafiados pelo exemplo cristão (do próprio Jesus Cristo, e de ao menos parte de seus seguidores), somos convidados (ou confrontados) a viver segundo o espírito desse exemplo, ou seja, a viver vidas altruístas (o que por sinal é chamado na Bíblia de "viver segundo o Espírito"), e ser cristão motiva-nos a viver assim.


Segundo, porquê, vivendo altruisticamente, ou ao menos nos esforçando para viver assim em alguma medida, somos consolados ou presenteados com a boa notícia de que mais pessoas viveram ou tentaram viver assim, entre elas, pessoas muito especiais, como Jesus Cristo, e ser cristão confirma essa forma de vida. 


Em ambos os casos ser cristão é um apêndice ou um complemento: ser altruísta é o ponto, mas é um ponto que tem mais a nos oferecer do que normalmente pensamos, ou normalmente obtemos, se não desenvolvemos, complementarmente, alguma religiosidade. 


Ser cristão é a religiosidade do altruísmo. O altruísmo é uma forma interessante de sermos felizes e de sermos justos: de respondermos às demandas da prudência e da moralidade. Mas é também uma forma interessante de religião: de respondermos às demandas do sentido último da vida e da vivência do mistério da existência. 


Neste último caso, a ideia é estendermos nosso ponto de vista particular, nossa visão de mundo, para uma visão mais abrangente; e a prática é transcender atitudes egocêntricas (e egoístas).


Agora tenho de dizer porque não ser cristão hoje, mas farei isso em outro artigo.

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