segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Aula VI - REPOSIÇÃO - Parte A - Graduação: Ética 1: Breve Curso de Metaética


Aula de Ética 1 - Breve Curso de Metaética

Prof. Alcino Eduardo Bonella  (UFU/CNPq)


Cap. 16 - De onde vem os padrões morais, afinal?

Se nós não produzimos os padrões morais, e nem Deus, de onde eles vieram então? Do ET de Varginha talvez? Ou será que ninguém os fez, porque nem toda norma precisa de um autor?

Mas se não há um autor, então as normas morais são eternas? (Já vejo o sorriso do professor Zé Maria, ou ouço sua risada...) Ora, se ninguém fez uma norma, então elas não vieram á existência em um dado tempo, e se assim é, elas sempre existiram. Se sempre existiram, existiram antes do ser humano aparecer. Isso soa estranho.

Argumento
1) Uma moral sem autor é uma moral eterna; 
2) Ora, uma moral eterna é algo estranho e implausível; 
3) Logo, uma moral sem autor é algo estranho e implausível.

duas respostas a este argumento: negar a primeira premissa ou negar a segunda.

i - A moral pode não ter nenhum autor e ainda assim não ser eterna, por exemplo, há leis objetivas que não eternas e nem foram criadas por nós, como leis científicas regulando o trabalho do DNA, da fotossíntese, e da sedimentação. Antes dos humanos havia cromossomos, plantas, ou rochas e então existiam leis destes tipos. E não são eternas, mas vieram assim que tais coisas vieram também. Simples. Não precisam ser eternas porque são objetivas. Precisamos de um argumento adicional para dizer que as leis morais são diferentes.

ii – Mas podemos dizer que as leis morais são eternas mesmo se se aplicam a seres que não são eternos, por exemplo, distinguindo princípios morais e fatos morai, os primeiros são cláusulas condicionais (Se x, então y), os segundos são exemplos ou instanciações dos primeiros. Não há fatos morais antes ao menos do aparecimento dos seres humanos, mas há princípios morais objetivos, e que podem ser eternos.

“(...) se você tortura outro por prazer, então isto é errado. Isto é verdade mesmo se não existam pessoas ao redor para torturar alguém. E continuará sendo verdade depois que os seres humanos desaparecerem. Todos os princípios morais mais profundos são assim” (p. 87)

Como 2 + 2 são sempre quatro. Ninguém inventou esta regra, ainda que a linguagem que a expressa foi inventada. Há um bilhões de anos atrás, se dois átomos se agrupavam com outros dois, quatro átomos resultavam desta combinação, embora ninguém havia para nomear o fato.

“Verdades morais vem de princípios morais, os quais são eles mesmos verdadeiros se corretamente descrevem a natureza do mundo moral”. (p. 90).

* * * * *

1 - Explique a primeira resposta ao argumento da eternidade das leis morais. (em casa)

2 - De onde vem os padrões morais?




Cap. 17 - Valores em um mundo científico


A botânica tem fatos sobre plantas, a geologia sobre rochas. Na botânica e na geologia, a evidência é ofertada por coisas tridimensionais e físicas (naturais). Podemos ver, cheirar, tocar, ouvir e saborear. Mas não saboreamos ou ouvimos etc. o certo e o errado. 

Fatos morais, se existirem, são estranhos: a realidade objetiva parece incluir moléculas, estrelas, peixes, nuvens e partículas atômicas, entre outras coisas, mas quando queremos falar de uma realidade moral objetiva, falamos de fatos naturais e não temos fatos morais diferenciados.

Pode ser que em nossa ontologia devamos suprimir fatos morais então. É o que sugere uma interpretação da chamada navalha de Ockam ou economia metodológica (não multiplicar entidades e teorias se temos versões mais econômicas que fazem o mesmo trabalho explicativo).

Uma aplicação cética disto: a coisa em questão é requerida para ajudar a explicar o que vemos no nosso mundo? Se não, a cortemos de nossa visão de mundo, e isso parece ser o caso dos fatos morais que o objetivista supõe existir, assim como fazemos do mesmo modo com forças sobrenaturais depois de conseguirmos uma explicação natural ou física. 

A ontologia do objetívismo ético é menos econômica do que a cética: além de prótons elétrons, moléculas, gases e líquidos, também temos, no mínimo, o certo e o errado. Navalha nisso, pede o cético.

Parece que princípios morais e fatos morais ou não servem para explicar nada, e então “navalha neles”, ou servem, mas então, não explicam fatos naturais (o argumento a partir da navalha está errado).

Mas admitir fatos morais explicados pelos princípios morais é uma forma de petição de princípio, que assume que existem tais fatos, que precisavam ser demonstrados!

A solução: rejeitar que algo só existe se existe uma necessidade explicativa que ele preenche. Fatos morais não explicam nada e ainda podem existir, como fatos epistêmicos, que são normativos e não descritivos. 

(a) Há implicações absurdas se aceitamos aplicar a navalha de Ockan: não só fatos morais tem de ser cortados, mas muito mais, como balas e martelos usados em um assassinato. 

(b) Há fatos normativos, como os epistêmicos (se há muita evidência para crer em x, deve-se crer em x; se crer em x implica a verdade de y, deve-se crer em y): eles,como os morais não descrevem ou explicam como as pessoas agem, mas como as pessoas deve agir. 

(c) limites da ciência e do critério da confirmação: ele próprio é filosófico e não algo confirmável, logo, a ciência tem limites e não deve nos impor nada com a navalha empírica apenas.

“Devem existir algumas verdades normativas, que não são o tipo de coisa que fornece qualquer explicação, e, ao invés dito, nos guiam sobre como devemos agir ao fazer coisas. Se não existem tais verdades, então a navalha de Ockan, que é um princípio normativo, não poderia também ser verdadeiro.” (p. 140).

* * * * * * * *

1 - A qual das quatro abordagens (do breve curso de metaética) o argumento da navalha se liga mais direta e apropriadamente? Por que? (em casa) 

2 - A qual das quatro teorias discutidas por Hare se aplica a posição de Shafer-Landau? Por que? (em casa)

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Cap. 18: Conhecimento Moral I: Quatro Argumentos céticos

Argumento da incerteza. Sem certeza, não há conhecimento moral. Mas sem certeza não há outros tipos de conhecimento, e nós não exigimos isso em outras áreas do conhecimento. Ou não há tais conhecimentos também, ou é possível conhecimento moral.

Argumento do desacordo epistêmico. Tal desacordo impede que se conheça a verdade moral: duas pessoas bem esclarecidas e racionais ainda divergem moralmente, e não podem saber quem possui a verdade. Mas se houvesse mesmo tal equipolência entre as posições, ambas teriam sua razão de ser, e poderiam duvidar apenas da do oponente e não de ambas ou de si mesmo, desafiando o outro a realmente ter uma boa posição. Se ambos estão certo e tem de suspender o juízo, então também tem de suspender o juízo sobre outros tipos de crenças que também sofrem de desacordo epistêmico, que são todas elas! Se isso é exagero, então o conhecimento moral é possível.

Argumento da perspectiva {cada ponto de vista é visto de um ponto}. Para conhecer as causas de um acidente recorremos à pessoa que tinha a melhor visão do que ocorreu. Mas não há o ponto de vista do universo ou de lugar nenhum na ética. Logo, não há conhecimento ético. Contra tal argumento se pode tentar defender que há tal perspectiva, ou, alternativamente, que realmente não existe, mas que o conhecimento ético não depende dele. 

(i) Existe tal perspectiva melhor: por exemplo, em alguma variação da regra de ouro das principais religiões e filosofias morais: se você, colocando-se no lugar do outro, aceita a ação, ela é certa, se você a rejeita, ela é errada (mas isso falha porque você pode aceitar para si o que o outro de fato não aceita para ele). Outra perspectiva é a do observador ideal: sem falsas crenças, bem informado, sem interesses, e imparcial entre os interesses. Porém, (a) parece a muitos algo impossível; (b) ou não é o melhor ponto de vista moral, se comparado com um apaixonado, engajado, e com preferências especiais; (c) ele é o melhor, mas mesmo assim haverá desacordo entre observadores ideais (!). 

(ii) Assuma que não se tem tal perspectiva. O que se conclui disto? Não que não podemos ter conhecimento moral. Mesmo sem tal perspectiva ideal há ainda várias perspectivas melhores ou piores, mesmo que imperfeitamente, como em outras áreas do conhecimento (científicas) e como na filosofia. A falta de perspectiva ideal é um conhecimento filosófico que possui sua perspectiva: não há a melhor perspectiva para se provar isso mas o cético continua com seu ceticismo.

Argumento da evidência inadequada. A evidência moral é de um tipo mais complicado ou inferior à evidência em outras áreas (não é tangível, quantificável). Se parece com uma recitação das próprias opiniões morais. 
             A evidência empírica por si não resolve nenhuma questão ética, que permanece em aberto. Mas a ética é um ramo da filosofia, e os métodos possíveis para se fazer filosofia são eles próprios fruto de exploração filosófica (novo desacordo!) Mas, (i) apesar de controverso, um método que contenha lógica e teste factual, além de crítica por parte de outros e obrigação de apresentar argumentos evitam a caricatura da filosofia como área da mera intuição de cada um. (ii) Quem duvida da verdade moral tem uma informação filosófica. Se não há conhecimento filosófico, ou não há verdade filosófica, ou não há crença filosófica justificada, mas há as duas coisas, logo, há conhecimento filosófico possível, e conhecimento moral possível. (Se a evidência empírica é necessária para o conhecimento, é uma tese filosófica para a qual não há tal evidência, e então, ela teria de ser recusada!).

“Se o conhecimento moral requer certeza, consenso difundido, uma única e melhor perspectiva, ou evidência empírica determinante para seu apoio, então não temos conhecimento moral. Mas podemos ter conhecimento sem certeza, sem consenso, sem uma perspectiva ideal e sem suporte empírico determinante. Podemos então ter conhecimento moral”. (p. 117)

* * ** * *

1 – Reconstrua os passos da resposta do autor ao argumento da perspectiva. (em casa)

2 – Por que a evidência empírica não soluciona problemas morais como o do aborto? Por que é possível conhecimento moral se ele é sempre um tipo de aplicação a priori de métodos filosóficos que não pode ser certificado empiricamente?


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