4.
Equivalência Moral.
Equivalência
Morar significa que toda e qualquer concepção moral é tão certa ou tão
errada quanto qualquer outra. Isso soa democrático, é da moda (é algo
contemporâneo) e é normalmente aceita em vários círculos, especialmente
universitários, mas como algo teórico, abstrato, quase nunca diante de
exemplos concretos, sejam mais
dramáticos (concepções morais nazistas versus liberais, concepções
discriminatórias e opressivas versus benevolentes), sejam menos
dramáticos, quando sustentamos uma posição moral em primeira pessoa.
Ora, o niilismo, o subjetivismo e o relativismo social acarretam a equivalência moral. Se rejeitamos
a equivalência moral, então temos razões para rejeitar estas filosofias, e adotar o objetivismo. Por que?
Porque
se o niilismo (a interpretação de que nada é certo ou errado
moralmente) fosse verdadeiro, a ideia comum que em geral aceitamos. de
que se alguma ação é correta, então sua negação tem de ser errada, teria
de ser abandonada. Se o nazista diz que exterminar judeus é justo,
então o que o liberal diz, que o extermínio não é justo, teria
necessariamente de ser errado, e vice-versa. Se eu digo que meninos e
meninas devem ser tratados com igualdade, então quem diz que não devem,
devem estar errados. Mas se o niilismo é aceito não podemos pensar
nestes termos. Isso não significa que o niilismo é falso, ele pode
afinal ser verdadeiro, mas não temos muitas razões ou argumentos fortes
em seu favor, e temos vários em favor de outras interpretações, como a
subjetivista, a relativista social e a objetivista.
A
equivalência moral implica que, havendo várias perspectivas morais,
todas
tem o mesmo valor. Todas são corretas (ou falsas). Mas isso não procede,
pois do fato de que há várias perspectivas morais, não se segue
necessariamente isso, pois algumas
podem ser melhores do que outras (normativamente falando), mesmo sendo
apenas uma perspectiva dentre outras (empiricamente falando). Do
fato de que toda reivindicação moral é expressa em uma perspectiva
particular
não se segue que toda a moralidade é puramente convencional (e possuem,
todas as moralidades, igual valor).
Veja
o exemplo das ciências e da matemática: quando
se discorda em uma delas, havendo mais de uma perspectiva sobre a
verdade científica (que a Terra gira em torno do Sol X que o Sol gira em
torno da Terra, por exemplo), não implica ou acarreta que todas as
posições são verdadeiras, são adequadas, ou dependem
da opinião dos que acham isso ou aquilo, ou, da opinião da sociedade.
A equivalência moral se apoia no argumento da Liberdade de
Consciência e de Expressão: (1) todos nós temos igual direito de
expressar nossas opiniões morais; (2) esse direito de igual opinião e
expressão dá a nossas opiniões o mesmo
valor moral; (3) logo, a opinião de cada um está correta e é
moralmente equivalente à dos outros. Mas a segunda premissa é falsa!
Seja em matemática, biologia,
engenharia de automóveis, ou ética, este passo não se segue da primeira
premissa. Eu posso ter direito e direito igual de ter uma opinião sobre o
motor de meu carro, mas daí não se segue que minha opinião seja
necessariamente equivalente, em sua adequação ou correção, à de meu
mecânico, que também é engenheiro de motores. O mesmo.
"Embora
meu direito de ter uma opinião sobre a natureza de uma galaxia
distante, ou sobre a estrutura celular de uma romã, seja tão justo e
válido como o direito de qualquer outra pessoa, ele não significa que
minha opinião sobre estas matérias é tão justa e plausível como,
digamos, de um astrônoma e de um botânico".
O mesmo para a ética, pensa ao menos Shafer-Landau (e eu).
5.
Progresso Moral, Comparação Moral.
Ocorre progresso quando indivíduos ou sociedades
vem a ser melhores moralmente. Por exemplo, quando criminosos se recuperam, ou
quando a escravidão é abolida. Pode haver também regressão moral, quando indivíduos
endurecem seus corações e se tornam mais violentos e exploradores dos outros.
[Um
exemplo de progresso moral é a consciência de que os casais gays tem os
mesmos direitos, e a prática de garantir-lhes igualdade jurídica,
casamento civil e adoção de crianças, como o Brasil tem recentemente
garantido a eles, através de várias decisões da Suprema Corte, baseadas
as decisões na Constituição, que fala de igualdade, não-discriminação e
dignidade da pessoa humana. Você concorda? Mas um exemplo de regressão
moral é o que ocorre nos Estados Unidos, quando o dono de uma rede de
lanches manifesta repulsa pela igualdade para os gays e sofre então, no
dia seguinte, a crítica severa de grupos defensores da igualdade: mas o
que ocorre então? Filas imensas para comprar lanches na rede do cara,
aumentando enormemente os lucros deste, por parte de pessoas que se
identificaram com a opinião discriminatória, majoritária naquele lugar.
Regressão moral!]
"As
sociedades são capazes de progresso moral. A maioria das sociedades que
costumava tolerar a escravidão não o faze mais. Muitas sociedades que
já proibiram as meninas de estudar agora lhes dão educação como aos
meninos. Nós hoje frequentemente tratamos as pessoas com deficiências
mentais e necessidades especiais muito melhor do que já fizemos no
passado. Certamente em tudo isso ainda há muita imperfeição, mas
comparado com onde estávamos cem anos atrás, estamos meio aos trancos e
barrancos um pouco à frente do que estávamos". (p. 22)
Mas
para dar sustentação a essa interpretação, parece que temos de
pressupor um padrão de avaliação para a
comparação do período A com o período B, um que seja independente do
padrão vigente ou do padrão passado, sejam eles preferidos
individualmente ou consentidos socialmente, não importa, tem de ser um
tipo de padrão objetivo.
Mas
se isso é verdade, o ceticismo ético, em sua concepção de equivalência
moral, não pode integrar esta noção popular ou comum de progresso ou
regresso moral: o ceticismo implica
que nunca há um padrão objetivo, e a equivalência impedira a comparação,
logo, a avaliação comparativa.
Porém,
pode haver uma concepção cética de progresso, ainda que de tipo mais
restrito: seja pelo abandono de crenças falsas (que podem ser todas as
crenças morais, se
somos teóricos do erro ou niilistas), seja pelo alcance ou não dos
objetivos almejados pelas pessoas individualmente, se somos
subjetivistas, ou das culturas, se somos relativistas sociais, seja pela
maior
coerência entre as crenças vigentes.
O
problema é que a primeira interpretação, niilistas, pressupõe o que
deveria demonstrar, ao supor que não há nenhuma verdade moral objetiva, e
as outras duas interpretações são bem restritas pois não colocam em
questão os próprios costumes e concepções fundamentais das pessoas ou
culturas: pode ser que os objetivos centrais sejam eles próprios
imorais.
Niilistas são como ateístas, se deus - ou a moral
objetiva - não existem, então não é possível nem estar mais próximo deles (de deus ou da verdade moral), e então, nem
progredir moralmente no sentido apropriado, ou regredir.
Subjetivistas e Relativistas enfrentam problemas
parecidos: o passado é julgado pior ou melhor do que o presente, sempre com um
deles decidindo isso, ou pela preferência individual, ou pela vigência social
ou acordo social, o que é injusto, pois um dos competidores julga o outro,
enquanto o precisaria haver, para progresso ou regresso moral, seria um juiz
imparcial.
Um
juiz imparcial seria um padrão independente das preferências,
individuais ou culturais, e isso é exatamente o que a interpretação
objetivista propicia.
1 - Como a concepção sobre o erro moral se relaciona com os problemas da
equivalência moral e do dogmatismo, segundo Shafer-Landau?
2 - Como poderíamos defender a posição cética e atacar a posição
objetivista mantendo tudo o mais como está, nos exemplos e supostas
implicações de cada concepção, segundo o autor?
3 - Explique a concepção de erro e de progresso moral para o subjetivista e para o relativista social.
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